O cultivo de abacaxi em território brasileiro acaba de ganhar um reforço importante: o primeiro Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc) da cultura com abrangência nacional.
A nova ferramenta, publicada pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) em 13 de fevereiro, orienta produtores de todos os municípios do país sobre as melhores condições de plantio, com base em dados científicos e históricos.
Desenvolvido pela Embrapa, o novo Zarc atualiza e amplia a versão anterior, de 2012, e traz melhorias que prometem aumentar a produtividade e diminuir riscos, especialmente em regiões vulneráveis, como o Semiárido.
Classificação em níveis de risco
A nova versão traz três atualizações importantes. Uma delas é a classificação em três níveis de risco (20%, 30% e 40%) associados às fases de desenvolvimento de frutos, desde a floração, passando pela frutificação, até a colheita, sendo 40% o risco máximo aceitável para o cultivo.
Com isso, são gerados calendários de plantio que indicam quando e onde a cultura pode ser mais produtiva e ter mais sucesso.
O engenheiro-agrônomo Mauricio Coelho, pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura (BA), responsável técnico e coordenador do Zarc Abacaxi, ressalta que os riscos são importantes em diferentes períodos de desenvolvimento da cultura. Por isso, resolve-se utilizar critérios para quatro fases de crescimento:
Fase 1: implantação e o desenvolvimento inicial da planta;
Fase 2: crescimento vegetativo;
Fase 3: indução floral e início de frutificação; e
Fase 4: desenvolvimento do fruto até a colheita
Outra novidade é a categorização das classes de água disponível do solo, variando de 1 a 6, e não mais de 1 a 3.
“A variação de 34 a 184 milímetros por metro de profundidade, dependendo da textura do solo, representa melhor os tipos de solos existentes no Brasil. Essas classes de solo têm a ver com o armazenamento de água, essa capacidade afeta muito o risco climático”, ressalta o cientista.
Segundo ele, quanto menor for essa ‘caixa d’água’, mais acentuado vai ser o risco, a depender do solo. “Se houver tendência de acúmulo prolongado de água no solo, também será um dos problemas da cultura justamente o excesso de água. Áreas com encharcamento não são recomendadas para o cultivo do abacaxi”, esclarece Coelho.
Em relação à temperatura do ar, locais com probabilidades de geadas frequentes e plantios localizados em altitude superior a mil metros também foram considerados de risco climático elevado.
Outro avanço importante da nova versão é que, pela primeira vez, o sistema considera as exigências das principais variedades plantadas no Brasil, que foram divididas em dois grupos:
‘Pérola’, ‘Turiaçu’ e ‘Smooth Cayenne’ (grupo 1, mais rústico)
‘BRS Imperial’ (grupo 2, mais sensível aos estresses ambientais e que requer um cuidado maior no cultivo).
A portaria do Zarc Abacaxi obriga que, no estabelecimento de novas áreas com novas variedades devem ser utilizadas mudas produzidas em viveiros credenciados em conformidade com a Legislação Brasileira sobre Sementes e Mudas (Lei nº 10.711, de 5 de agosto de 2003, e Decreto nº5.153, de 23 de agosto de 2004).
Redução de riscos na cultura do abacaxi
O engenheiro-agrônomo Hugo Borges Rodrigues, coordenador-geral de risco agropecuário do Departamento de Gestão de Riscos da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agrisultura (Mapa), destaca que a atualização do Zarc Abacaxi é de grande relevância para a pasta, visto que integra o esforço contínuo de modernização das ferramentas de gestão de riscos agropecuários.
“Sua atualização reforça o compromisso do Mapa e da Embrapa com a sustentabilidade e a resiliência da produção agrícola nacional”, afirma.
“O principal benefício para o produtor que segue as orientações do Zarc é a redução do risco climático no cultivo, já que a ferramenta indica os períodos mais favoráveis ao plantio com base em critérios técnicos e científicos”, ressalta.
Além disso, conforme Rodrigues, o cumprimento das recomendações do Zarc é condição para o acesso a importantes políticas públicas de gestão de riscos, como o Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro) e o Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR).
Atualização dos dados meteorológicos
O pesquisador da Embrapa Agricultura Digital (SP) e coordenador da Rede Zarc Embrapa, Eduardo Monteiro, destaca as mudanças no novo zoneamento, em especial as ligadas à base de dados meteorológicos. “Agora são considerados os dados meteorológicos atualizados até 2022, incluindo, portanto, dados bem mais recentes em relação ao zoneamento antigo”, salienta.
A base de dados meteorológicos é composta por séries históricas obtidas a partir das redes de estações terrestres, meteorológicas e pluviométricas convencionais e automáticas do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).
O pesquisador Domingo Haroldo Reinhardt, que coordena as pesquisas com abacaxi na região de Itaberaba – principal produtor de abacaxi do estado da Bahia – e faz parte da equipe técnica do Zarc, ratifica as melhorias da ferramenta: “A metodologia foi bastante aprimorada, principalmente quanto aos níveis de capacidade de armazenamento de água, ainda mais para a região semiárida, como é o caso de Itaberaba, onde existem variações grandes dentro do mesmo município. Sem dúvida, o produtor novo deve recorrer ao Zarc, assim como aquele produtor que quer investir em novas áreas de plantio”.
Validação dos produtores
Pela primeira vez, o Zarc Abacaxi ganhou uma importante fase: a validação junto a produtores, técnicos e representantes da cadeia produtiva. Duas reuniões foram realizadas via internet com participantes das regiões Norte e Nordeste e da região Centro-Sul, respectivamente.
“Nós trabalhamos em um modelo que vai ser aplicado em todo o país, por isso, ele tem que representar bem as condições do desenvolvimento e dos riscos climáticos em todas as regiões. Precisávamos do feedback dos polos de produção para tentar corrigir alguma falha, se houvesse, antes da publicação das portarias”, explica Coelho.