Em ação fiscal entre segunda-feira (19) e esta sexta-feira (23), o Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-MS) e a Auditoria Fiscal do Trabalho, com apoio das polícias Militar Ambiental e do Ministério Público da União (MPU), flagraram trabalho análogo à escravidão e tráfico internacional de pessoas em duas propriedades rurais localizadas na zona rural dos municípios de Anastácio e Paraíso das Águas.
Em Paraíso das Águas, a fiscalização constatou crime de tráfico internacional de 16 trabalhadores, 14 deles paraguaios e dois nacionalizados brasileiros, e entre eles dois adolescentes, cujo trabalho rural é proibido. Já em Anastácio, três trabalhadores foram resgatados, no dia 19 de maio.
A primeira propriedade já havia sido diligenciada na semana passada pelos auditores-fiscais do trabalho. Na ocasião, foram encontrados indícios da presença de trabalhadores, como roupas e documentos pessoais. Contudo, eles não foram localizados. Ao ser questionado, o gerente da fazenda negou a presença de qualquer trabalhador no local.
Em nova diligência, esta no dia 21 de maio, foi possível apurar que ele havia determinado aos empregados que se escondessem no mato para evitar o flagrante, conforme os depoimentos coletados pelo procurador do Trabalho Paulo Douglas Almeida de Moraes.
Os trabalhadores narraram terem sido levados em três veículos até o município de Camapuã, seguiram para Campo Grande, onde jantaram, e, finalmente, chegaram a Bela Vista, município que faz fronteira seca com o Paraguai. De lá, atravessaram a fronteira a pé para a cidade paraguaia de Bella Vista Norte, onde grande parte do grupo residia, a 600 quilômetros de distância do local de trabalho.
Os trabalhadores eram contratados, sem registro em carteira, para realizar diversas atividades na propriedade, que atua na criação de gado de corte, recebendo uma diária de R$ 80. A cada três meses, podiam retornar ao país de origem, com as passagens de ida e volta custeadas. O empregador também fornecia Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e alimentação.
Entretanto, caso o trabalhador não permanecesse no serviço por, no mínimo, 90 dias, os custos com passagens, alimentação e EPIs eram descontados da remuneração, elementos que caracterizam servidão por dívida e cerceamento do direito de ir e vir.
Mediante estas condições as quais o grupo era submetido, o MPT-MS irá conduzir uma audiência extrajudicial, no início do mês de junho, na qual deverão estar presentes o proprietário da fazenda e os trabalhadores resgatados, e será proposto um TAC (Termo de Ajuste de Conduta).
Anastácio
Na zona rural de Anastácio, três trabalhadores foram resgatados, no dia 19 de maio. Durante a fiscalização, constatou-se que, além dos trabalhadores que realizavam atividades no campo, havia equipe que anteriormente atuava na reforma de uma ponte e, no momento do flagrante, fazia a instalação de cercas em um corredor da propriedade.
Essa equipe estava na fazenda há cerca de três meses, sob a responsabilidade de um dos trabalhadores resgatados, contratado diretamente pelo proprietário da fazenda.
O empregador forneceu uma motosserra, mas não houve confirmação sobre o fornecimento de EPIs nem sobre o registro formal desses trabalhadores. As atividades da equipe eram supervisionadas pelo proprietário, que comparecia à fazenda de duas a três vezes por semana.
Constatou-se, ainda, que os trabalhadores estavam alojados em condições inadequadas, uma vez que o empregador não permitiu que ficassem junto aos demais empregados da fazenda.
No local, havia energia elétrica, mas não existiam instalações sanitárias adequadas: os trabalhadores precisavam tomar banho no Rio Engano e fazer as necessidades fisiológicas no mato. Além disso, o trabalhador responsável pela equipe não dispunha de condução própria, sendo obrigado a fretar um veículo para seus deslocamentos.
O empregador fornecia apenas carne para a alimentação da equipe, item que não era cobrado, enquanto os demais mantimentos eram custeados pelos próprios trabalhadores.
Somente em 2025, 52 trabalhadores foram resgatados em condições análogas à de escravo, todos eles em propriedades rurais em Mato Grosso do Sul.