O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) descobriu oito erros e prejuízo de R$ 59,2 milhões no setor de precatórios do TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul). O pente-fino foi feito em 2014, mas os resultados não vieram a conhecimento público. Agora, o documento dos achados do CNJ foi anexado ao processo em que o Governo do Estado cobra prejuízo após R$ 21,2 milhões pagos a maior para a construtora Andrade Gutierrez, de Minas Gerais.
Precatórios são valores que o poder público (municipal, estadual ou federal) é obrigada a pagar a uma pessoa física ou jurídica após condenação judicial definitiva. Em outras palavras, o precatório é o reconhecimento pelo ente público de que existe uma dívida em aberto com alguém.
Na varredura de 2014, o CNJ apontou pagamento a mais no caso do precatório de grande repercussão. Quando a prefeitura de Campo Grande fez acordo para repassar uma fortuna ao empresário Jamil Name. Ele furou a fila cronológica da ordem de pagamentos alegando questão humanitária. O pagamento começou em 2009, mas acabou suspenso pelo CNJ.
De acordo com o relatório, quando o precatório alcançou a posição cronológica para ser pago, foi encontrado valor excedente de R$ 13,6 milhões. Anos depois, o desembargador aposentado Paulo Alfeu Puccinelli virou réu por autorizar o pagamento fura-fila de R$ 25,5 milhões para Jamil Name.
A liminar foi concedida no dia 10 de julho de 2009. Três dias depois, a prefeitura da Capital, na gestão de Nelsinho Trad (PSD), firmou acordo com Name para pagar R$ 18 milhões, em 13 vezes de R$ 1,3 milhão.
No entanto, ele acabou recebendo somente a primeira parcela. As demais prestações foram repassadas aos empresários e irmãos Jorge e David Haddad. O pagamento foi suspenso pelo corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dip, em abril de 2010.
Em 2019, Name foi alvo da operação Omertà, que investiga execuções, milícia armada e corrupção. Ele faleceu no ano de 2021, quando estava preso em Mossoró (Rio Grande do Norte).
Em outro precatório, cujo credor era Milton da Costa Lima, a correição encontrou valor pago a maior de R$ 19 milhões. O devedor era a prefeitura de Campo Grande. Já nos cálculos do Departamento de Precatórios do TJ-MS, o poder público ainda precisaria desembolsar mais R$ 78,3 milhões.
“Além do acréscimo indevido no valor do precatório (superior a 500%), há fortes indícios de favorecimento no pagamento. E isso porque, enquanto alguns privilegiados credores receberam quase a totalidade do seu direito, outros nada receberam”.
Já no procedimento envolvendo o credor Andrade Gutierrez e a devedora Agesul (Agência Estadual de Gestão e Empreendimentos), o CNJ identificou valor excedente no montante de R$ 12,1 milhões.
Também com a Agesul como devedora, outro precatório, dessa vez tendo a Engesul Ltda (empresa de Gilberto Miglioli) como credora, resultou em pagamento a maior de R$ 9,8 milhões.
Fraude
A agência e a Engesul ainda surgem num segundo procedimento, desta vez envolvendo o Frigolop Frigoríficos Ltda e pagamento indevido de R$ 1,3 milhão.
O precatório era de R$ 16,4 milhões. Mas em 2005, houve cessão de crédito de R$ 420 mil ao Frigolop. Esse direito foi repassado a Campo Grande Couro Ltda. No ano seguinte, em 2006, a duas empresas fizeram compensação com o Estado e a dívida foi quitada.
Sete anos depois, em 2013, a Campo Grande Couros surgiu como credora de R$ 1,1 milhão, apesar do débito já ter sido quitado e do curtume estar com as atividades encerradas na Receita Federal.
O empresário José Carlos Tavares Pinto, da Campo Grande Couro Ltda, confessou ter participado da fraude junto com o juiz Aldo Ferreira da Silva Júnior e o dono do Frigolop, José Carlos Lopes.
A Agesul ainda surge como devedora em um quarto precatório que caiu na malha fina do CNJ. Tendo como credor “Marcelo Barbosa Martins e outros”, o conselho verificou excedente de R$ 3,4 milhões.
Mundo Novo e Dourados
A lista da inspeção também tem precatório devido pelo município de Dourados à empresa Cobracon Ltda (Cobrança e Consultoria). Além de débito da prefeitura de Mundo Novo com a Metalúrgica Carlesso Ltda. Neste caso foi recomendada a revisão do valor do cálculo do precatório.
Irregularidades – Segundo o relatório, foram verificadas as seguintes irregularidades: aplicação de juro compensatórios que contrariam jurisprudência do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e a Constituição Federal; ausência da exclusão de juros no período da graça constitucional; aplicação de indexador diferente do determinado na Constituição Federal; e anatocismo (juros sobre juros).