Os advogados Felipe Cazuo Azuma e Alberi Rafael Dehn Ramos, que representam Thais Carlos Ponce, vítima de violência doméstica praticada pelo vereador Diogo Castilho (DEM), estão acusando a vereadora Lia Nogueira (PP) de protelar o arquivamento da denúncia número 4463/2021 para favorecer o agressor de mulheres.
A vereadora Lia Nogueira é presidente da Comissão Processante instaurada para investigar a quebra de decoro parlamentar do colega e aliado Diogo Nogueira, mas que acabou barrada pela Justiça sob o entendimento que as provas que sustentaram a denúncia não poderiam ter sido tiradas de um Inquérito Policial sob segredo de justiça.
Após esse entendimento do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, uma segunda denúncia foi apresentada contra o agressor de mulheres na Câmara Municipal, mas para que essa investigação siga seu rito normal é preciso que Lia Nogueira, na condição de presidente da primeira Comissão Processante, proceda o arquivamento da mesma, coisa que, segundo os advogados, a vereadora vem se negando a fazer e, com isso, benéfica o aliado.
A estreita amizade entre ambos vem desde o início do mandato, em 2021. Prova disso é que em 5 de maio do ano passado, ambos usaram de tráfico de influência para furar fila de atendimento no Hospital da Vida e garantir uma cirurgia de emergência para uma então assessora da vereadora.
O episódio foi parar no Ministério Público Estadual e o promotor de Justiça, Ricardo Rottuno, da 16ª Promotoria de Justiça de Dourados, chegou a intimar o diretor-presidente da Fundação de Serviços de Saúde de Dourados (Funsaud), Jairo José de Lima, para que explicasse o episódio que colocou a assessora na frente de outros 15 pacientes que esperavam por cirurgia no Hospital da Vida.
Em petição encaminhada à Lia Nogueira, os advogados de Thais Carlos Ponce explicam que a Comissão Processante formada para apurar a denúncia nº 4463/21 deve ser extinta e o procedimento arquivado. “Conforme se vê nesses autos, a Comissão foi formada em 11 de setembro de 2021 e o representado (Diogo) apresentou defesa prévia em 7 de outubro de 2021, ou seja, já está tramitando há quase 6 meses, tempo muito superior previsto no Decreto-Lei 201 de 1967”, alertam os advogados.
Felipe Cazuo Azuma e Alberi Rafael Dehn Ramos ressaltam que o Decreto-Lei 201 estabelece, em seu art. 5º, VII, que o “processo, a que se refere este artigo, deverá estar concluído dentro em noventa dias, contados da data em que se efetivar a notificação do acusado. Transcorrido o prazo sem o julgamento, o processo será arquivado, sem prejuízo de nova denúncia ainda que sobre os mesmos fatos.”
Para os representantes de Thais Ponce, houve a superação temporal que fulmina e revela a extinção desta Comissão, considerando a não apreciação do mérito nesta Comissão, em 28 de janeiro de 2022, apresentou-se nova denúncia (Comissão Processante 167/2022) a fim de que os fatos fossem, de fato, apurados e julgados pelo Plenário da Casa de Leis. “Pois bem, nesta nova Comissão Processante, em consulta aos autos, o denunciante e a vítima Thais Ponce tiveram a informação de que a defesa do vereador Diogo Castilho pleiteia o apensamento da denúncia 4463/21 com a denúncia 167/2022, articulando a existência de litispendência”, alertam os advogados na petição encaminhada à Lia Nogueira.
Para eles é um absurdo completo, ao contexto que a processante formada em razão da denúncia 4463/21 representa de um nada jurídico, ante a decadência, “o que reclama o arquivamento do feito procedimento, nos termos do art. 5º, VII, do Decreto-Lei 201 de 1967”. Os advogados explicam ainda que as questões processuais discutidas na Comissão Processante nº 4463/2021 (e que não se aplicam à denúncia 167/22) travaram o andamento do procedimento, o que fez perecer a pretensão punitiva e, consequentemente, como não há suspensão de prazo sujeito à decadência, faz exsurgir o arquivamento do feito”.
Manobra de Lia
A manobra de Lia Nogueira é clara no sentido de salvar o mandato de Diogo Castilho. “A bem da verdade, juridicamente, a Comissão Processante 4463/21 não existe mais, eis que a finalidade a que se destina não pode mais exercer seu mister”, explicam os advogados na petição. “Há, então, necessidade de se se lavrar a certidão de óbito de denúncia 4463/21 com a determinação de seu arquivamento”, completam.
Eles ressaltam que chama atenção do denunciante e de Thais o fato de que, passado tanto tempo e já tendo sido iniciada outra Comissão Processante, a vereadora Lia Nogueira ainda não ter determinado o arquivamento desta. “A lei é claríssima: transcorrido o prazo de 90 (noventa) dias sem que se tenha o julgamento, o destino da denúncia só pode ser o arquivo! Então, o que é necessário para que faça isso imediatamente?”, questionam.
Para os advogados da vítima, essa postura, essa forma de agir, de retardar os atos nesta Processante, permite que se levantem dúvidas sobre a motivação de Lia Nogueira em seguir inerte. “Ora, será que está retardando para criar filigranas jurídicas – ineficazes, diga-se – com objetivo de ajudar o vereador Diogo Castilho?”, voltam a questionar. “É possível se pensar assim, já que tanto Vossa Excelência (Lia Nogueira) como o denunciado (Diogo Castilho) representam a oposição”, completam.
Por fim, os advogados enfatizam que “se assim o for, além deve ser passível de condenação de ato de improbidade em razão de evidente desvio de finalidade, há possibilidade de responsabilização penal em razão do retardamento do dever de ofício”. Felipe Cazuo Azuma e Alberi Rafael Dehn Ramos finalizam a petição ressaltando que “à Thais não importa quem é oposição ou situação, não interessa o jogo da política, importa é que a lei seja obedecida e a lei reclama que este procedimento seja arquivado”. Ao final, eles fazem um alerta: “a manutenção, ainda que meramente formal em razão da decadência que já se abateu neste caso, é um despropósito e uma negativa de atuação de Vossa Excelência e que pode gerar consequências”.
Outro lado
A vereadora Lia Nogueira foi procurada pela reportagem do portal Malagueta para responder às acusações feitas pelos advogados de Thais Carlos Ponce e afirmou que não houve manobra alguma. “Dentro das prerrogativas que me cabem, tirei o processo da Secretaria da Câmara de Vereadores para proferir o meu despacho de um requerimento que foi direcionado a mim como presidente da Comissão Processante”, explicou.
De acordo com Lia Nogueira, o processo estava suspenso e disponível na Secretaria da Câmara sem nova movimentação desde janeiro de 2022. “Porém, o advogado da senhorita Taís não manteve as suas cópias atualizadas e quis que eu interrompesse o trâmite para dar a minha decisão para que ele tirasse cópia dos autos”, enfatizou.
Lia Nogueira foi enfática ao afirmar que não houve qualquer irregularidade. “O processo ficou comigo uma semana apenas e ele teve meses para tirar cópia se quisesse. Reitero que agi na mais restrita legalidade”, garantiu. “Como eu não extingui o processo que está suspenso por decisão do TJ e não minha, eles estão buscando desmerecer a minha atuação”, argumentou. “A Comissão Processante está suspensa e não arquivada e reforço, por decisão judicial”, finalizou.