Evolução ocorreu ao mesmo tempo em que campos, florestas e pastagens encolheram; entidade atribuiu fenômeno à recuperação de áreas degradadas
Estudo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) sobre a produção agrícola colocam Mato Grosso do Sul como o 5º mais importante celeiro do Brasil, que neste ano deve gerar uma safra de mais de 22 milhões de toneladas. Resultado de um trabalho cada vez mais tecnológico, é fato, mas que também demanda um espaço considerável para gerar centenas de milhões de reais em soja, milho e algodão –que respondem por mais de 99% da safra.
Não por acaso, entre 2000 e 2018, as áreas agricultáveis de Mato Grosso do Sul aumentaram quase 60%, conforme apontado no Monitoramento da Cobertura e Uso da Terra do Brasil, também do IBGE. A última atualização deste estudo traz dados entre 2016 e 2018, quando a área agrícola do Estado avançou 4,92%: de 43.330 km², chegou a 45.462 km².
O espaço dedicado à agricultura representa 12,7% de todo o território de Mato Grosso do Sul, superando a área somada de 33 municípios de médios a pequenos –entre eles Bataguassu, Jardim, Guia Lopes da Laguna e Mundo Novo– ou, ainda, aproxima-se do somatório das áreas de Campo Grande (8.082 km²), Três Lagoas (10.217 km²), Dourados (4.062 km²), Porto Murtinho (17.505 km², o segundo maior do Estado) e Coxim (6.392 km²).
Em 2000, as áreas agrícolas identificadas pelo IBGE ocupavam 28.633 km², ou seja, em um intervalo de 18 anos, o crescimento das terras utilizadas para a produção de cereais, oleaginosas, leguminosas e outras culturas cresceu 58,77%. São 16.829 km² a mais de terras, no mesmo período em que a áreas de pastagem com manejo e de vegetação florestal ou campestre encolheram.
Nos mesmos 18 anos, a área de vegetação campestre perdeu 12.447 km², saindo de 102.300 km² para 89.853 km² (mais de 12% de retração). As florestas perderam 1.816 km² (46.454 km² para 44.638 km²); e as pastagens com manejo, 6.443 km² (4,12%, caindo de 156.632 para 149.909 km²).
Entre 2016 e 2018, o IBGE colocou a faixa entre Campo Grande e Cassilândia como destaque entre aquelas nas quais houve maior evolução de terras agrícolas. Via assessoria, a Famasul (Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul) explicou que essa região viu a expansão das áreas de grãos (soja e milho) e de florestas plantadas.
Já sobre a evolução das terras agricultáveis, a entidade que congrega os produtores rurais sul-mato-grossenses vê, principalmente, um esforço para ocupação de áreas de pastagens, em maioria degradadas, com a agricultura. O projeto Siga-MS, parceria entre a Famasul e, Aprosoja-MS (Associação dos Produtores de Soja do Estado) e Governo do Estado, identificou de 2009 a 2020 a conversão de 3,5 milhões de hectares (ou 35 mil km²) de pastagem –a maioria com algum nível de degradação– em áreas de grãos e eucalipto.
“Esse crescimento se deve aos investimentos privados e públicos em aumento de produção e produtividade, por meio também de pesquisa, impulsionados pela forte demanda interna e externa por alimentos e celulose”, pontuou a Famasul, via assessoria.
Quanto à possibilidade de a agricultura avançar para florestas, a entidade rebate o “lugar comum” de se culpar a atividade rural por tal fenômeno. Ao contrário: a Famasul defende que Mato Grosso do Sul é referência em produção sustentável.
“Mato Grosso do Sul ainda possui mais de 40 % da sua área em vegetação nativa (florestal e campestre), e o crescimento das áreas agrícolas e de floresta plantada tem sido sobre áreas de pastagens com algum nível de degradação. Somos um Estado referência em produção sustentável, tendo sido o berço e canal de disseminação de práticas conservacionistas, como a Integração lavoura-pecuária-floresta, carne, carbono neutro, plantio direto, novilho precoce, carne pantaneira sustentável, dentre outras”, complementou a entidade.
Apesar das alegações sobre a evolução das áreas plantadas não agredirem as matas nativas, há indicativos que vão para o lado oposto. Doutora em Ecologia e Conservação e bióloga do Instituto do Homem Pantaneiro, Angélica Guerra alerta que um estudo sob condução da entidade aponta que, até 2070, Mato Grosso do Sul poderá perder mais 20 mil km² de vegetação nativa.
“Mas ainda não avaliamos as consequências desta perda sobre a biodiversidade e serviços ecossistêmicos”, advertiu ela. Angélica destaca, contudo, haver avaliações de que a perda de vegetação no Pantanal e arredores pode resultar em erosão do solo, produção de sedimentos e atingir a disponibilidade hídrica.
Um meio de evitar esse pior cenário são os incentivos a instituição de APPs (áreas de preservação permanente) e reservas legais “na manutenção desses serviços”. Outra oportunidade seria a produção de baixo carbono –de menor impacto para a atmosfera–, uma iniciativa ainda pouco desenvolvida no Estado.
“Produzir gado com baixa emissão de carbono e implementação de sistemas integrados de lavoura, pecuária e floresta, os chamados ILPF, são oportunidades de conciliar os usos do solo, com intensificação sustentável e manutenção da biodiversidade”, destacou ela. “Para o Pantanal, vemos que a produção tradicional de gado em pastagens nativas é um grande diferencial, e isso atrelado à produção com baixo carbono é uma grande oportunidade”.